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terça-feira, 2 de agosto de 2011

O Grito "Profético" da Noruega


Encontrei no Blog do Hermes C. Fernandes, esta matéria de Marina Silva.. Eu não poderia deixar de publicar em meu blog este texto tão bonito, tão inspirador eu não sei se é um artigo ou um poema


O Grito "Profético" da Noruega





Por Marina Silva

Visitei três vezes a Noruega.

Em duas fui a trabalho, como ministra do Meio Ambiente, e, na última, tive a honra de receber o Prêmio Sofia. Já da primeira, impressionei-me com a ausência de ostentação, que pude ver em três dimensões: nas ruas, com a simplicidade das pessoas; nas esferas de poder, como no austero gabinete do amigo Erik Solheim – que acabara de ser nomeado ministro- e, principalmente, na arte, em uma visita ao Museu Nacional, onde vi a obra “O Grito”, de Edvard Munch.
Tão dura expressão do horror humano ante a fúria da natureza despertou-me um sentimento ambíguo de plenitude, no qual se combinavam medo e gratidão. Sensibilizada, expressei-me em versos: “Mesmo sem voz é profética, mesmo sem rima é poética, mesmo sem forma é estética, mesmo em segredo revela-se”.
Para mim, a arte permite conhecer algo mais elevado e profundo da condição humana -e agradeço a Deus por essas mensagens. Até o medo faz parte dessa plenitude.
O pavor que grita no quadro de Munch é o de um tempo em que não agredíamos tanto a natureza e, embora nos sentíssemos vulneráveis, talvez não o fôssemos tanto quanto hoje.
O pavor que sentimos em relação à natureza talvez seja o que ela sente em relação a nós. Sou grata pelo aprendizado.
Magnífica a arte, de incessantes profecias, até quando ignoraremos o que seu olhar antecipa? Os noruegueses gritam pelo massacre ocorrido na semana passada. Todos gritamos, solidários na dor.
Como em Munch, o pavor de hoje foi antecipado em seu significado essencial: talvez horror ainda maior do que a natureza nos causa quando nos enfrenta possa advir do cavalo de Troia oculto em nós mesmos. O que tememos é algo terrível que subsiste na natureza humana, uma sabotagem contra a diversidade da cultura e da vida, que é a mais preciosa condição de sua continuidade sobre a Terra.
Sublime é o medo quando se torna um temor respeitoso de que esse laço, de pertencimento à natureza e unidade entre os seres humanos, possa se romper de vez.
O povo norueguês, que carrega sua simplicidade nesse tempo de delírio consumista, que apoia programas internacionais, inclusive no Brasil, na defesa do ambiente e da biodiversidade, encontrará os meios de ressignificar o irreversível. Temos ainda de buscar força diante das dores e dos massacres que vivemos.
Talvez encontremos esperança nas palavras Hannah Arendt, para quem os homens “embora devam morrer, não nasceram para morrer, mas para recomeçar”. Mergulhando em nossa dor, acharemos o ponto onde ela se origina: ao nos separarmos da natureza a ponto de nos opormos a ela, separamo-nos e opomo-nos a nós mesmos. Precisamos, portanto, recomeçar.
fonte: Folha de S.Paulo (Via Pavablog)

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